segunda-feira, setembro 06, 2004

A Riqueza

Descobri uma forma de tirar proveito imediato e generalizado desse instrumento muitíssimo obsoleto ao qual resolveram um dia chamar "Lei". É muitíssimo simples: ao ver, na rua, cartazes com mensagens como "o corpo que você sempre quis ter", despoleto processos por publicidade enganosa e por invasão de privacidade contra os criadores da obra. O argumento prima por ser quase ridículo, de tão óbvio: ou entraram de rompante na casa de cada um, descobrindo a idealização individual do corpo humano presente em cada ser humano e estamos perante um caso de invasão de privacidade ou então mentem com quantas letras têm no word e desconhecem por completo a idealização que cada pessoa faz do seu corpo. Como tal, tendo em conta a inexistência de bases de sustentação perante tão conclusiva afirmação, já que o anúncio se destina a cada transeunte que o lê, estamos perante um caso de publicidade enganosa. Doutra forma, não compreendo como poderão ter descoberto qual é, a título de exemplo, o meu corpo de sonho.
Seria possível recorrer também ao transtorno causado pelas fotografias da capa, bem como à mensagem subliminar inerente, para despoletar um processo por danos morais causados às pessoas vítimas de perturbações relacionadas com dietas, perdas de peso e corpos esculturais.
Acusar-me-ão de ser um explorador, um vampiro de caninos aguçados, à espera da primeira oportunidade para conseguir fazer dinheiro à custa do sofrimento dos outros. Desenganem-se. Poucos quererão mais do que eu erradicar da face da terra essas revistas ridículas com soluções milagrosas e promessas inverosímeis que atormentam muitas das pessoas que se limitam a olhar para os seus anúncios. Se o pudesse fazer sem ganhar o que quer que fosse, tanto melhor. Bastar-me-ia encerrá-las por completo para me sentir recompensado. Quem ousar referir a liberdade de imprensa merece o epíteto de "refinadíssimo/a imbecil". A liberdade de cada um termina onde começa a do outro, apesar de alguns meios de comunicação/entretenimento não se considerarem abrangidos por essa regra social.
Se eu pesar trezentos quilos e achar o meu corpo fabuloso, tenho liberdade para o fazer e não admito a ninguém a ousadia de me querer dizer qual é o corpo com que sempre sonhei, porque esse é o que eu tenho e, quando não for, saberei, sem qualquer tipo de ajuda, qual será.
Estou absolutamente farto deste género de anúncios, deste tipo de promessas, destas frases mirabolantes. Servem únicamente para perturbar as cabecinhas já muito pouco esclarecidas de muita da nossa juventude. Para quando um anúncio a afirmar "os livros que você sempre quis ler" ou "as peças que você sempre quis ver" ou ainda "1001 maneiras maneiras de deixar de se preocupar com o que os outros pensam e começar a pensar de forma mais incisiva por si mesmo"?